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domingo, 30 de junho de 2013

transatântico

ah, como seria bom
ter você em meus braços
te sentir até o último suspiro
vai que num sonho você se apresente
e na realidade eu te tenha de presente
ah, como seria raro
ter-te em contratempos
em pestes negras
em pragas faraônicas
nos mais sangrentos desatinos
e noutra face contemplar tua beleza
ah, como seria intenso 
saber das tuas dobras
desafiar as tuas coxas
dominar as roxas camadas de tuas mucosas
abrir seus buracos com a "calma-ferocidade"
dos casais apaixonados
assimilar as noites com tuas luas
temperamentos que só a mim concederia
ah, como seria um escravo
um reles empregado de tua empresa
limparia todo o seu passado
as suas doenças, dores de amores mal quistos
colaboraria com tua felicidade
cortaria os pulsos dos incomodados
extrapolaria uma vida por ti
por sorte um diagnóstico
me traria a luz de minha patologia
e sem intimidade com a medicina, riria
pela falta de bom censo, pela crítica dos doutores
pois nada no mundo equivale a sua lira
nem mesmo uma rima rica
nenhum texto seria capaz de descrever-te
nenhum delírio onírico
desculpe meu eu-lírico pobre
nenhum nobre seria capaz de conter-te
por isso me atento a minha insignificância,
não tenho palavras, nem mesmo elegância
ah, como seria raro
nosso encontro noutro cosmos
outras vidas te completam, eu sei
seria mesmo um deus
uma força maligna
que controlaria este meu estado?
poderia arrancar minha pele
extrair meus dentes
tirar minha casa, meu sustento
mas nunca deixar-me sem teu perfume
nessa minha perspectiva de ser
sua atenção eterna e aventura
acelerada e inconsequente
ah, como seria bom 
se fosse tua minha vida
e se tudo fosse esquecido
nossos desentendimentos
que nunca foram entendidos
assim por ti me arrisco
imerso no teu transatlântico
me atiro sem aviso
assim por ti sobrevivo

domingo, 23 de junho de 2013

Rainha

Quero ver você permanecer na estrada até o último momento
até a morte parecer barata
até as minuciosas frustrações suicidas se tornem concretizadas
até que o último segundo cesse
até a espera desses últimos tempos
Volte, antes que todas as baratas do universo explodam
e toda camada "baratal" se funda e forme uma crosta
volte, antes que milhares de vidas baratais estejam na venda
estão duvidando de sua existência
de sua forma de brincar com os cometas
de começar do zero uma ação inesperada
de botar ovos e povoar colônias
assim sofro - como a nostálgica invenção do telefone sem fio
começa com “digo isto”, mas é sempre aquilo
sempre um grito confuso, fosco
Fale baixinho, não apenas a mim
toda a sua verdade
tenha um troço
e cresça com fermento ou nessa anarquia de si
encha nossos corações mesquinhos
ou entregue o jogo – a tua aldeia
invente um outro de ti pra acompanhar e bendizer os súditos
pois é nisso que tudo pára:
a busca pela sucessão de seu trono
e se por acaso não aguentares esta vida e cometeres haraquiri
perderemos o rumo e os sentidos das antenas
para quê estamos nesse universo explorador
se antes mesmo de aparecer você se esconde
e brinca de voar? 

domingo, 9 de junho de 2013

Estranhos

O silêncio é suportável até para os incertos. E como seria se outra música tocasse meu coração daquela mesma maneira que fora há tempos distantes? Será que suportaria carregar outra conspiração dentro de meus sonhos? Porque somente os que amaram se tornaram capazes de enfrentar terceiros tempos, só os que se importaram com a não mesmice das noites e dançaram os compassos incertos sentirão a delicadeza dos dias – certamente ouviria que era impossível ser aquilo que desejas, ou tornar-se-ia impraticável, seria apenas o começo. Diante de tantos anseios, a sobra do passado que corrói a saudade já não é mais a mesma – se tornou concreta, imutável e mantida em um sigilo, que de tanto pensar ficamos à sombra da morte, indivisíveis e alheios à queda iminente.  Por certo quando os elos forem desfeitos e apropriados a um único ser, este sim sairia ileso e por cima de tudo, não que eu mesmo queira sair por cima, ou que me importe, ou que você também o queira, mas é claro que posso procurar um título maior, desde quando os moralistas em questão estão divisados entre o bem e o mal; e entre essas arestas  posso assim ser o rei da miséria que intitula nosso tempo. Mas como somos dependentes sempre nos esbarramos e aquela fagulha se expande e se torna impraticável. Belo seria possuir e deixar de lado, ás moscas, para que num tempo distante se valha até mesmo o adubo que adquire as hortaliças menos apreciadas. Porque a prática retrátil de qualquer selvageria apimentaria todo um contexto. Nela estariam corretos e enviesados todos os problemas românticos. E foi-se a nitidez de um vidro, seguimos embaçados. Pois havia entre nós uma clareza de sentidos que se ajeitava nas simples coisas. E aceito sim, a tua ira, a tua condenação ignóbil de que nunca seremos compatíveis – a tua distância apenas esclareceu os fatos, colocou-os em ordem, de forma que agora posso entendê-los. Se a tua chaga fosse fatal provavelmente me colocaria em algum eixo, me traria aquela importância que colocaria todo o nosso jogo à prova. Não condeno a tua impaciência, tampouco me faço de total culpado. Apenas sigo nesse desastre e me apego ao pegajoso cárcere que criei. Não digo que estou seguro, muito menos fui o que saboreou mais e destemperou o clima. É que havia a capacidade de refrear aquela nossa ideia de que tudo era possível, sem medidas ou contratempos – por mais enganador que pareça e por mais perecível que se encontre nosso estado, vivemos em calamidade; aprecio essa vista e a pratico da janela.  Passado a prática sem medidas e contratempos, ficamos em suma semelhantes ao que os outros são: apenas outros.


"Ensaio um beijo com amor de pecado mortal
e deixo que saia um sabor de recado final
eu vou derramar a doçura saliva do beiço
no seio, cintura, em sua boca 
na face, nas curvas da carne, nos laços do peito
jurei poemas mil vadiei o seu sono
tapei o canto vazio com teu desenho risonho
será que serei o primeiro a te merecer
o bem que me faz admito é melhor que perder"