Marcadores

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Acertando os Ponteiros- Final

16h15. Continuei dentro da Organela, sair seria desistir e eu não queria perder a confiança em que poderia modificar o que ainda é modificável. Uma fato era sabido: Se o motorista queria ver Dora à noite necessitaria de utilizar sua força de trabalho para diminuir sua jornada. E como o motorista, agora conhecido como marido de Dora, sr José, queria ter sua noite de descanso; passou a correr e diminuir o tempo das paradas entre a troca de passageiros, diminuindo o numero de pagantes pela sua justa causa de ser feliz. Não era um bom dia para ganhar grana, era segunda-feira, dia do batente forçado. E provavelmente aqueles que iriam pegar um meio de transporte para viajar deveriam estar conscientes de que o transporte seria mais rápido e de que não precisariam de se preocupar com detalhes como velocidade X tempo. Por isso a minha falta de preocupação quanto ao horário do ónibus era inconsciente. Eu notara que estava em vantagem. Que o tempo poderia ser determinado pelas ações, até porque pensar em dominar as horas era descabido ­_ um momento cotidiano determina seu tempo, se você não se apressa é porque descobriu que a rotina é prazeirosa, se você corre é porque busca mais tempo. No fim as horas ainda apresentavam sua divindade imutável e indiscutível. Todos nós estamos à mercê do tempo, só não podemos estar dependentes do relógio. Somos os novos administradores de nosso tempo.

Passar a ver o mundo de outra forma não é difícil pra quem molda o compasso das horas durante o cotidiano. Moldar e modificar as ações é deixar que as situações se façam presentes e incertas; tão incertas como deixar os sentimentos mais nobres sobre o cuidados de terceiros .Talvez a vida seja um quebra cabeça, ou um brinquedo desmontável. Talvez os moldes para encaixar o tempo sejam a desculpa humana de querer o melhor quando somos os melhores, ou achamos ser. Nunca estamos satisfeitos, nunca somos bonitos ou interessantes, e quando somos, ignoramos até mesmo quando somos ouvidos. Ignoramos nosso poder de persuasão e de capacidade dinâmica avançada de sairmos da carne. Somos apenas uma imagem holográfica em um jogo, ficamos presos aos nossos capuzes e armaduras medievais, lutando com dragões e mocinhos brilhantes, lutando pelo direito de livre expressão e escolha, lutando contra nossos próprios medos e linhagens incertas. Pode o tempo ser incerto pra mim hoje que eu não me abalo. Estamos em tempos difíceis e um pingo de amor pelo próximo seria a atitude correta. O tempo que passou desde a última guerra não compensa o tempo que foi perdido pela sua destruição.

Até mesmo o sol indicava que aquela tarde era inóspita e devagar. Se eu me preocupasse muito com a prova não deixaria para estudar dentro do ônibus, no dia da prova. Parecia bobagem, mas senti um ar de dominador da situação. Não que o ambiente inóspito fizesse a ocasião de parecer-me esperto. Mas agimos as vezes por instinto, e os acertos são meras tentativas e adaptações. Aprendizado para acertar o mantra. Estudo, estudo, estudo... Consegue ver o teor da mantra? Pensar primeiro, dosar e rotular, e assim meus tiques não ficariam tão descabidos se adotássemos um mantra mais humano. Procure entender que as situações se repetem, por isso somos o fruto desse comportamento social. O desejo de entrar no ritmo que é a chave para o eixo_ em mim um desejo incontrolável de tentar nivelar um ponto exato de encontro entre o ônibus e a Van. O desejo de realizar um pensamento.

Naquela mesma hora,16h16, Renato parava o veículo com seu aceno de braços, deixando a oportunidade de quebra de rotina se apresentar naquele momento. Parei simultaneamente _ Não parei, apenas utilizei a única informação que poderia apresentar ao motorista em nível de vacúolo. Era como se a informação fosse "me expulse, estou cheio, preciso extravasar". O sinal foi dado e interpretado como a necessidade executável de quebrar a rotina , parei e saí do veículo.

Entrei dessa vez no ônibus universitário, com o sorriso de satisfação por ter sido uma coincidência métrica da vida: Coincidências são meros acasos, dentro de tantos acasos que se fazem durante os acertos de cada ponteiro do relógio.

Aqui são 00:59. Boa noite.

12 comentários:

Unknown disse...

"Moldar e modificar as ações é deixar que as situações se façam presentes e incertas., tão incertas como deixar os sentimentos mais nobres sobre o cuidados de terceiros."
Vou guardar essa... bateu no pâncreas.
rs
Abração

s a u l o t a v e i r a disse...

"... um momento cotidiano determina seu tempo, se você não se apressa é porque descobriu que a rotina é prazeirosa, se você corre é porque busca mais tempo. (...) deixando a oportunidade de quebra de rotina se apresentar naquele momento." Nossa!
Muito bom. Impressionante tua narrativa. Me perco nas horas também. hehe
Excelente, hehe tô sem palavras, vc constrói o texto com muita propriedade. Um talento, lembra disso, tá.?!

Abraços, ótima semana procê.

Rafael Sperling disse...

Fantástico, Áthila, foi bem profundo esse mesmo! Ficou ótimo...
Abraço

Rond disse...

Vc mudou issaqui.
bom, vc eh bom sempre neh amigo.
bjunda

Rob Novak disse...

"Ignoramos nosso poder de persuasão e de capacidade dinâmica avançada de sairmos da carne." Somos frágeis dependentes de um tempo que insiste em nos maltratar. Na hora da agonia, saimos de vez de nossa casca temporal e procuramos um lugar que independe do relógio. Às vezes essa saída da carne é defintiva e o holograma que somos se apaga...


Obrigado pelas vistas e comentários no meu blog! Saliento que o cafezinho durante meu tempo de recenseador não era batizado, não!..rsrs

Abraços!

Anônimo disse...

"me expluse, estou cheio, preciso extravasar". Pra mim, a síntese da tua narrativa é a sensação de asfixia que o tempo cronológico traz. Por outro lado, a informação mais claramente sinalizada é a URGENTE necessidade de transcender, fugir do tempo e das regras rígidas, normas e obrigações.
Alguns conselhos: cuidado com as idéias fixas, elas atormentam. Leia o que você mesmo disse a respeito do instinto, pois ele nos protege. E além disso, "não traia sua força, não, essa força que mora em seu coração."

Um abraço e obrigado por apresentar o final da história. (Muito embora a tua história, na verdade, ainda esteja apenas começando e, portanto, longe do fim. O que significa que pode ser diversas vezes reescrita, ainda. Pense nisso, aliás)

Gostamos de você.

Versos Meus disse...

Amigo saudade de vc, saudade verdade de quando a gente conversa e muito no msn. Aqui na Austrália eu nem tenho tempo pra msn...
Saudade de tantas coisas...
Enfim seu post esta perfeito digno de pertencer ao bom livro de contos e crônicas e ainda com um arremante bem filosófico.
Vc nos prendeu o tempo todo... vc está como vinho...quanto mais passa o tempo, mais "gostoso" rsrsrss na escrita hauhauhauhauhau e no modo de agrada nosso paladar literário hehehehehe
Bju meu
Jay

Augusto Barros disse...

Concordo com o Saulo Taveira: você constrói o texto com muita propriedade. Muito bem escrito e narrado. Gostei. Parabéns e sigo o seu blog!

Ira Buscacio disse...

Athila,

A continuação...

O tempo que ora constrói, ora desaba, comprime.

Vc é um contador de histórias, eu vou lendo e me envolvendo, e criando as imagens e num fôlego bom, contínuo.
Parabéns!

Bjssssss

Michele Pupo disse...

Amigo, escondendo o jogo não é?!
Já te disse, mas não custa repetir: você tem talento. Invista!

Beijo grande!

# Poetíssima Prida disse...

Outubro ROSA!
Visite o D'lírios.
Abraços nossos...
Poetíssima #

Lília disse...

Eu já não sei mais o que fazer com o tempo, acho que preciso gritar e estravazar também!

Texto muito bem construído! Adoro passar por aqui! bjks